O Ingá da Ilha dos Gansos Sinaleiros

* Por Mhanoel Mendes

Eu moro no Oikos, um espaço diferente que de uma barreira, de onde era extraída argila, nós estamos fazendo um local verde e aconchegante. Aqui, temos algumas construções como Lar de Encontros, Lar de Alimentação, Lares de Descanso, Lar do Cuidador, Lar na Árvore, Lar de Meditação, açudes, trilhas. Tem árvores, pássaros, animais. Além de tudo isso, também tem uma ilha. Na verdade, não é só uma, são três ilhas: a Ilha do Silêncio, a Ilha da Amizade e a ex-ilha dos Coelhos, atual Ilha dos Gansos Sinaleiros. É esta, a Ilha dos Gansos Sinaleiros, que vou me ater a partir de agora.

A ilha dos Gansos Sinaleiros fica pertinho do Lar de Encontros e serve de aconchego não só para os gansos do espaço, mas como para os patos e até pássaros. Existem poucas coisas na Ilha dos Gansos Sinaleiros. Uma casa para os patos e gansos, que já chocaram diversas vezes, e um pé de ingá. O ingá é uma fruta que dá em uma espécie de vagem, tem uma semente grande e seu fruto envolve a semente com uma “carne” branca e deliciosa. Hum, como é gostoso ingá. Pra mim, ingá tem gosto de infância.

Há  algum tempo percebi que o pezinho de ingá que havia plantado há uns quatro anos está imponente e soberano na ilha. Mas faz poucos dias que, a distância, observei seus frutos grandes e ainda verdes.

Eu adoro caminhar pelo Oikos, mas a partir desta descoberta, passava propositalmente as margens do açude e observava os frutos crescerem e até alguns poucos amadurecerem. “Hum, que delícia!”, pensava. Dias depois, vi uns frutos boiando no açude e os peixes na maior festa. Também vi pássaros desfrutando o ingá que parecia doce.

Todos os dias eu ia visitar o pé de ingá na Ilha dos Gansos Sinaleiros. E cada vez mais os frutos amarelavam para festa de peixes, gansos, patos e pássaros. E eu só olhava todo aquele movimento da natureza. Com tênis, sandália, calça, bermuda e camisa, eu seguia observando, embora desejasse cada vez mais experimentar aquele fruto.

Circulava em torno do açude para encontrar a menor distância e fazia as contas de quantos metros teria que pular para alcançar o objetivo. Impossível. Eu só queria um ingá. Só queria experimentar um gomo do fruto que eu ajudei a plantar. Pensei numa ponte. Afinal de contas, para que servem as pontes se não para ligar as pessoas a um sonho, a um objetivo? Mas uma ponte só para apanhar o fruto?

Um ingá. Só unzinho!

Os frutos do pé de ingá da Ilha dos Gansos Sinaleiros já estavam quase todos maduros. O verde se transformou em amarelo. Era visível que o tempo passava e a oportunidade de saborear o fruto estava também se indo. Um dia eu fui decidido para as margens do açude. Percebi que eu não poderia ficar ali, sentado, observando os frutos se transformarem em marrom, pois estavam apodrecendo. Eu os desejava amarelos, maduros. Se não tomasse nenhuma atitude, os ingás só retornariam no verão que vem.

Mas o fruto está ali, a uns quatro metros. É só eu tomar uma atitude. Eu preciso agir. Tirei minha camiseta e a pendurei em um moerão. Deixei minhas sandálias na beira do açude e fui. “Um dia a gente tem de deixar de sonhar e partir”, escreveu Amir Klink. A água estava fria. E olha que tive oportunidades bem melhores para isso, mas fiquei só no mental. Sei lá, pensava que algum milagre ocorreria e alguém, um pato, um ganso ou até mesmo um peixe poderia trazer um ingá para eu experimentar. Mas ninguém, fez isso. Nem fará.

E segurava firme no arame, única ligação da ilha com terra firme. Olhava de baixo os frutos que se apresentavam aos meus olhos. Eram muitos, todos amarelos. No ponto!

Cheguei na ilha e de dentro d´água apanhei um fruto. O galho se abaixou como se fizesse continência. Com a unha do polegar direito fui abrindo delicadamente a casca e aos poucos a parte branca ia se mostrando. Pela pequena fresta vi a “carne” macia. Um pouco do suco quis fugir pelo buraquinho, mas o suguei. Abro mais aquele gomo e de olho fechado desfruto merecidamente do néctar da atitude.

Subo na árvore e chupo um. Mais um. Agora posso escolher os mais gordos e cheios de carne. Todos são doces. A casca usada cai no açude e os peixes também aproveitam. Depois de apanhar uma boa quantidade de ingá e coloca-los no bolso, faço o meu caminho de volta. Deixo a ilha e com ela a conclusão de que se eu não tivesse desejado aquele fruto e enfrentado as adversidades para alcançá-lo, jamais teria sabido qual o gosto do ingá da Ilha dos Gansos Sinaleiros do Oikos.

* Escritor / www.oikos.org.br

Filipe Colombo

Sobre Filipe Colombo

Formado em Administração com ênfase em Marketing, É conselheiro profissional formado pelo IBGC e possui MBA em administração de empresas cursado nos EUA, China e nos Emirados Árabes. Acumula mais de 20 anos de experiência em gestão de empresas e é autor do best seller “Gestão Profissional na Prática”. Neste livro, são compartilhados ensinamentos, visões e conselhos que são frutos de sua experiência acadêmica e profissional.
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2 respostas para O Ingá da Ilha dos Gansos Sinaleiros

  1. J. Romeu Menezes disse:

    Muito bom os seus comentários, gente assim que precisamos no País, crio também gansos. E aproveitando para desejar um Feliz Natal e Próspero Ano Novo.

  2. ELISEU A OLIVEIRA REPRESENTAÇÕES disse:

    Muitas lições a serem aprendidas… Aqui em Bragança Paulista/SP tem um lago público grande com muitos gansos, patos, marrecos, patos d’agua e uma variedade de pássaros. Ao seu redor, os bragantinos fazem caminhadas, esportes e apreciam muito a natureza exuberante. Quanto aprendizado na observação silenciosa da natureza. O Brasil é pródigo em locais assim: São Tomé das Letras/MG, Chapada Diamantina/BA, Chapada dos Veadeiros/GO, Serra Gaúcha e os Cannyons, em SC quantos locais maravilhosos e o Amazonas então!!!! Por que será que tantos preferem as drogas, as bebidas e o crime, se há tanta coisa fantástica a ser aproveitada neste mundo criado por Deus?

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