Estepe

* Mhanoel Mendes

O caso que vou lhes contar ocorreu há alguns anos, mas ainda está dentro de mim pelo profundo aprendizado. Não imaginava que ao furar um pneu poderia ocorrer tantos desdobramentos e aprendizagem. Meu filho mais velho, o Lucas Luís, tinha cerca de oito anos e o Vitinho, o segundo filho, tinha quatro.

Tudo começou quando o Luquinhas me disse que gostaria muito de conhecer a cidade de Gramado (RS). Falava do que conhecia: da casa do Papai Noel, do Mini Mundo, da Cascata Encantada, bondinho, enfim, falou de um jeito que me convenceu. Naquele momento mesmo, pegamos um calendário para estudar a melhor data; escolhemos um feriadão de setembro, dia sete, que caía numa quinta-feira.

Já saímos de Criciúma numa quarta-feira a tarde para aproveitar bem o fim de semana prolongado. Lembro que minha mamãe foi junto. Os meninos estavam excitados com a possibilidade de conhecer Gramado e Canela e seus visgos, além de passar em Eldorado do Sul para visitar minha irmã e em Porto Alegre para almoçar com o tio Bernardo (in memorian).

Ao decidir pelo trajeto, sem saber das condições da estrada, decidi pelo menor trajeto. Assim, optei pela Serra do Faxinal, que liga Praia Grande a Cambará, na serra gaúcha. Começamos a subir a serra e logo nas primeiras curvas aconteceu o inevitável: furou um pneu. Estacionei naquela estrada cheia de pedras, retirei as malas, pois o macaco e o estepe ficavam logo abaixo. Neste momento o Lucas começa a chorar dizendo que vamos ficar ali na estrada, que logo começaria a escurecer, enfim, estava apavorado.

Procurei tranquiliza-lo enquanto trocava o pneu. Pronto! Recolocamos as malas dentro do carro e seguimos viagem. Ainda estávamos nos refazendo do susto quando ocorre o inevitável pela segunda vez consecutiva, distante somente poucos quilômetros. Sim, o estepe furou. Isso já ocorreu alguma vez com você?

Bem, não tinha mais o que fazer. Minha preocupação era tranquilizar o Lucas, pois estava todo preocupado, achando que íamos mesmo pernoitar ali perto do nada, no meio do mato. Pensava no seu desejo em conhecer Gramado e seus atrativos. De passear na casa da mana e almoçar na casa do querido tio Bernardo. Ainda tínhamos quatro dias intocados pela frente.

Foi quando parou ao nosso lado um senhor que, ao perceber a situação, tirou do porta mala o seu macaco e seu estepe e trocou o pneu do meu carro. Era Luiz, que morava em Cambará e era dono de um posto de gasolina, onde também funcionava uma borracharia. Fizemos uma bonita amizade, chegando, inclusive, a tomar café da sua casa, contígua ao posto.

Saímos dali e fomos para Gramado onde pudemos, enfim, curtir a cidade e suas delícias. Fomos na casa do Papai Noel, na cascata do Caracol, andamos de bondinho, curtimos o mini mundo, enfim, nos deliciamos na piscina quente do hotel. Tudo perfeito. Depois de Gramada e Canela, ainda esticamos a viagem até Eldorado do Sul, onde visitamos minha irmã mais velha; também fomos a Porto Alegre e almoçamos na casa do tio Bernardo no domingo. Só depois disso retornamos a Criciúma.

Meses depois, estava revisando o caderno do meu filho Lucas. Li uma tarefa onde ele deveria preencher respostas como “melhor amigo”, “cor preferida”, “melhores férias”… Qual não foi minha surpresa quando li a resposta a pergunta “melhores férias?”. “Gramado”, escreveu ele.

Lendo aquela resposta, tive um aprendizado, um bonito insight. Mesmo que no início da viagem algo ocorra de errado, onde fure um pneu e depois o estepe, mesmo que tudo se anuncie como algo catastrófico, esta pode ser uma excelente experiência. Ou, quem sabe,  as melhores férias da vida. Por isso, não é aconselhável tirar conclusões precipitadas de qualquer coisa que está no início, às vezes é prudente aguardar o final da experiência para se ter uma ideia global sobre ela.

* Psicólogo e escritor
www.oikos.org.br

Filipe Colombo

Sobre Filipe Colombo

Formado em Administração com ênfase em Marketing, É conselheiro profissional formado pelo IBGC e possui MBA em administração de empresas cursado nos EUA, China e nos Emirados Árabes. Acumula mais de 20 anos de experiência em gestão de empresas e é autor do best seller “Gestão Profissional na Prática”. Neste livro, são compartilhados ensinamentos, visões e conselhos que são frutos de sua experiência acadêmica e profissional.
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4 respostas para Estepe

  1. Salve Marcelo de Oliveira, paz!
    Impressionante, não é mesmo? Todos temos histórias e todas recheadas de emoção, entrega, espontaneidade e amor.
    Coincidência? … Pura sim-cronia.
    Um bom caminho,

    Mhanoel

  2. Olá, lendo seu artigo me lembei tbem de uma viagem aqui pertinho, Floripa, muita fila, engarrafamento, logo que chegamos a capital o motor ferveu e como um “anjo” nos foi oferecida ajuda, um cara que saiu do nada, chamado Paulo, com um jeep, nos rebocou até um mecânico, pela demora do serviço, usamos a cozinha do mecânico para preparar um lanche para nós, as crianças, o pessoal da oficina, enfim, deu pra todos o lanche. Fui lendo e me lembrando de cada detalhe, interessante como certas pessoas aparecem na nossa vida, no exato momento de nossa necessidade, nos “servem” e se vão. Quantos já passaram por minha vida assim, de vez em quando me lembro de um ou outro, muitos não tive mais notícias.
    Não sei se era esse o comentário que vc esperava, mas o seu texto me levou a essa minha viagem, mais de 10 anos atrás.

    Abraços

  3. Marcelo de Oliveira disse:

    Muito interessante… e novamente coincidências acontecem (já houve outra coincidência que te comentei)… Mas comentamos o texto então. A análise precipitada é sempre decepcionante, vejamos por exemplo a palavra preocupação, pré ocupação, se ocupar com algo ainda inexistente é no minimo ilógico, para não dizer desgastante e insano. Por conseguinte somente nos dá stress. Entretanto quando analisamos a posocupação/pós ocorrido vemos que sempre há uma experiência enriquecedora.
    Quanto a coincidência, vejamos… Estava eu subindo a serra da rocinha, com minha esposa grávida do meu menor, e meu filho Victor o mais velho, na época 5 anos, num fusca 1978. Eis que o meu fusquinha me deixa na mão, o salavanco era tanto que fez romper o cabo da distribuição, chovia e estava escurecendo com muita neblina, no meio do nada, meu filho e esposa no carro desesperavam-se, pois fatalmente teríamos que dormir alí mesmo. Após muito queimar a pestana para consertar o carro, fomos socorridos por um senhor dono de oficina em Sombrio, que descia a serra vindo de São José dos Ausente. Com o carro consertado continuamos viagem… Daí para frente este acontecimento, desenrolou-se em outros, que nos rendeu boas risadas e proporcionou um final de semana inesquecível, e que até hoje rende muito papo com os amigos.
    Um grande abraço!

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